QUEBRANTE nasce de uma instalação e se passa nas cavernas da região da Transamazônica
Premiada no Festival do Rio com o curta Curupira e a Máquina do Destino, a cineasta e artista plástica Janaina Wagner lançará seu novo filme no início de 2024, QUEBRANTE. O curta terá sua primeira sessão nacional na Mostra Panorama, da 27a Mostra de Cinema de Tiradentes, que acontece entre 19 e 27 de janeiro; e sua première internacional será na seção Forum Expanded, do Festival de Berlim, que ocorre entre 15 e 25 de fevereiro.
“Os festivais são janelas de difusão e visibilidade gigantes. Em Berlim, essa seção combina cinema experimental com arte contemporânea, que é meu campo de trabalho. É uma maneira de colocar ele em diálogo com outros filmes que sejam dessa mesma vertente. É um privilégio poder dividir uma obra quando está pronta. Para mim, o mais importante dos festivais é que sejam de curadoria que eu admiro muito”, explica a cineasta.
QUEBRANTE foi filmado em fevereiro de 2023 e começou como a instalação Cinema Caverna (Quebrante) para a 22a Bienal SESC Videobrasil, que está em cartaz no SESC 24 de Maio (SP) até 25 de fevereiro. “A ideia para a instalação e o curta vieram da possibilidade de tentar mostrar ao espectador essa experiência de estar dentro da caverna que eu construo no Quebrante que é baseado num projeto de um artista visual já morto chamado Robert Smithson, que era fazer um cinema dentro de um caverna ou campo de mineração”
O curta percorre as ruínas da Rodovia Transamazônica BR-230 e sua fantasmagoria. Situado na pequena cidade de Rurópolis (PA) - a primeira a ser erguida na Rodovia para servir de base aos trabalhadores que a construíram – QUEBRANTE acompanha Dona Erismar, conhecida na região como A Mulher das Cavernas. Professora aposentada, ela foi responsável pela descoberta das cavernas na região.
Janaina começou a trabalhar com a região Transamazônica entre 2019-2020 para seu primeiro curta metragem para cinema, Curupira e a Máquina do Destino, que é uma resposta e uma conversa com o filme Iracema - Uma Transa Amazônica, de 1975, dirigido por Jorge Bodanzky e Orlando Senna.
“A Transamazônica me interessa por ser uma Estrada que corta e atravessa a história do Brasil, por ser um projeto de nacionalismo construída durante a ditadura e um projeto que infringiu muita violência e ainda existe como projeto – nunca foi concluída. Comecei com a história da curupira, essa Iracema Fantasma do filme, e agora as cavernas. Gosto de investigar tudo o que se cruza nesse caminho dito progresso que gerou tanta destruição, e é um fantasma vivo da história do Brasil”.
A cineasta explica que seu trabalho é movido pela busca entre a forma poética e a política. “Toda forma tem que ser um veículo para esse conteúdo, o poético é o veículo pra trazer o conteúdo político de denúncia social. Acho que um trabalho pode ser político enquanto linguagem, sempre busco uma maneira de tratar assuntos sociais de uma forma poética que não seja panfletária. Política e poética podem estar entrelaçadas, e essa é a maneira que sempre tento trabalhar.”
Para filmar em Rurópolis, Janaina enfrentou desafios enormes – desde exercer diversas funções no filme, por causa do baixo orçamento, até o transporte de um projetor de 16mm de São Paulo até o local. “Foram dois voos e um trecho de carro, com o projetor 16mm, que pesa 17kg, e não pode ser despachado, porque é muito delicado e não dava pra levar na mala de mão. Coloquei numa sacola de ginástica, e levei na mão. Eu tinha de fingir que não pesava nada para não ser parada. Já para levar energia até a caverna, compramos um gerador que pesa 40kg.”
Janaina define o curta como uma homenagem às professoras, que são as verdadeiras heroínas do Brasil, e também aponta que é um filme sobre a escuta, sobre escutar o outro e as coisas.
“QUEBRANTE mostra que há um mundo subterrâneo, com as pedras que guarda suas histórias, que são invisíveis, mas sensíveis e importante de serem escutadas. Com esse filme quis escutar as pedras e o que elas têm a dizer. Dentro dessa história cíclica de desilusão e anúncio desse futuro, que é um pouco naufragado, existem esses pequenos monumentos que são as testemunhas dessa história que, nesse caso, são as pedras. O filme diz que precisamos escutar outras vozes.”
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