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12ª Mostra de Cinema de São Miguel do Gostoso-RN - Comentários sobre os filmes – Parte II

De 20 a 24 de novembro de 2025


Comentários sobre os filmes – Parte II


cartaz da mostra
cartaz da mostra

Não foi possível assistir todos os filmes da mostra, apesar de toda beleza, é bastante cansativo, mas daquilo que assisti, descrevo brevemente algumas impressões. O que chamou bastante a minha atenção foi a quantidade de filmes que de certa forma trazem um panorama de nossas memórias, seja pela via da homenagem (Pupá, Dona Onete – Meu Coração Neste Pedacinho Aqui), da distopia (Futuro Futuro), do indivíduo (Medo de Cachorro, Aqui Não Entra Luz) ou da comunidade (Kaira e o Temporal).


Dia 20/11 – Quinta-feira/Mostra Competitiva


Dia dos Pais (Bernardo Ale Abinader, AM, 2025, ficção, curta)


Com uma fotografia instigante, vemos o personagem de Adanilo numa interpretação sensível e sutil, cruzar um igarapé para encontrar o pai num barco-bar. Diálogos de enfrentamento que podem levar à tragédia, assim como ao perdão, dentro da fantasia de cada um, projetados numa pegada futurista no meio da floresta. Um filme muito criativo.


Dia dos Pais
Adanilo

A Natureza das Coisas Invisveis (Rafaela Camelo, DF, 2025, ficção, longa)


O encontro de duas garotas num hospital que conversam sobre a morte ao mesmo tempo que brincam. Do real urbano ao onírico rural, sobre sororidade e a transmissão dos rituais das rezadeiras. Um filme delicadíssimo que cresce no circuito e atiça a propaganda boca à boca (falarei dele em outra postagem).


Sofia e Glória
Sofia e Glória

Dia 21/11 – Sexta-feira/Mostra Panorama


E Seu Corpo é Belo (Yuri Costa, RJ, 2024, ficção, curta)


Com estética setentista impressionante, durante 14 minutos acompanhamos o drama amoroso, mas não só, entre dois homens negros: um jovem que se envolve homoeroticamente pela primeira vez e, o outro mais velho, que não se autoriza totalmente a essa relação. Tarô, sangue, água e fogo embalando a cultura black que fervilhava na época.


E Seu Corpo é Belo (
Estética setentista


A Vaqueira, a Dançarina e o Porco (Stella Carneiro e Ary Zara, CE, 2025, ficção, curta)


Velho-oeste-urbano-alcoólico-neon-queer onde a paixão esmaga sem dó as violências produzidas por figuras masculinas decadentes. Peca pelo excesso de cortes rápidos, mas é uma bem vida estória a la tarantino.


A Vaqueira, a Dançarina e o Porco
A Vaqueira, a Dançarina e o Porco

Uma Baleia pode ser Dilacerada como uma Escola de Samba (Marina Meliande e felipe M. Bragança, RJ, 2025, ficção, longa)


Com uma mise-en-scène próxima ao teatro, testemunhamos o fim melancólico de uma escola de samba. Curioso ver a Sapucaí sem nenhum glamour. Seria um filme melhor se fosse um curta.


Uma Baleia pode ser Dilacerada como uma Escola de Samba
Uma Baleia pode ser Dilacerada como uma Escola de Samba


Mostra Competitiva


Pupá (Osani, RN, 2025, documentário, curta)


A obra reafirma que as figuras heroicas são de carne, osso, defeitos, vícios e geram ótimos risos, além da importância da homenagem em vida. Essa personagem singular discorre livremente sobre sua vida entre cigarros, filhote de cachorro, jogo do bicho, filhos e inúmeros abandonos maritais sem nenhuma condescendência. Como documentário é um pouco conservador e com uma certa rigidez nos enquadramentos.


Edna Maria, a Pupá
Edna Maria, a Pupá

Buenosaires (Tuca Siqueira, PE, 2025, ficção, longa)


Cidade do agreste pernambucano homônima da capital argentina, o filme explora de forma divertida a divisão entre os torcedores do Brasil e da Argentina durante uma copa do mundo. A narração off em espanhol é cheia de humor e irônica, trazendo comentários políticos. Poderia ser um curta já que o filme não avança para possíveis outras similaridades com o país hermano.


Buenosaires
Buenosaires

Presépio (Felipe Bibian, RJ, 2025, ficção, curta)


Uma arma de verdade mata. Uma arma de brinquedo pode rachar qualquer relação familiar. Em tempos de proliferação de discurso de ódio e infestação de fake news, qualquer vacilo acaba com a festa. Uma vaca de presépio com cabeça de dragão pode anunciar o fim da tolerância e, o amigo secreto, pode revelar muito mais do que devia. Ao final do filme a gente emudece.


Presépio
Presépio


Queimando por Dentro (Enock Carvalho e Matheus Farias, PE, 2025, ficção, curta)


Jogo dos erros: um filho gay vai continuar frequentando a igreja a mando do pai, este mesmo que não vai mais deixá-lo dançar na trupe da...mesma igreja. Batidas na porta causam tanta aflição quanto uma violência física. O tema é atual, requer engajamento e coragem. Já a obra tem uma narrativa convencional.



Queimando por Dentro
Queimando por Dentro


Morte e Vida Madalena (Guto Parente, CE, 2025, ficção, longa)


Incômodo, estranho, bizarro, engraçado, hilário, genial. Os bastidores inacreditáveis de um set de filmagem sob o olhar de uma produtora que mesmo desesperada, é blasé. Um trabalho maravilhoso da atriz Noá Bonoba, mas também de todo um elenco afiadíssimo. Filme dentro do filme, filme B e a bravura de se fazer cinema neste país. A gente sofre mas se diverte.


Morte e Vida Madalena (Guto Parente, CE, 2025, ficção, longa)
Nataly Rocha e Noá Bonoba

Dia 22/11 – sábado/Mostra Potiguar


Medo de Cachorro (Ítalo Tapajós, RN, 2025, animação, curta)


Um recorte de memória delineado nos traços adoráveis de uma animação simples e encantadora. Quem tem cachorro ou teve não ficará indiferente. O nossos medos cotidianos tratados com delicadeza e melancolia. Não adianta: animação é algo que sempre me pega de jeito.


Medo de Cachorro
Medo de Cachorro


O Nó do Diabo (Igor Bezerra, RN, 2025, ficção, curta)


Três ladrões sem honra, uma mata, mala com dinheiro, martelo e veneno, ingredientes interessantes para uma narrativa de horror e moralidade, mas que se perde em didatismo e conveniências.


O Nó do Diabo
O Nó do Diabo

Passagem única (Raquel de Queiroz, RN, 2025, ficção, curta)


Partindo de uma estória que envolve as dificuldades que surgem para uma parte da população ao chegar a faculdade, incluindo corrupção municipal, a ideia é boa, mas, a execução nem tanto.


Passagem única
Sim, são gêmeas

Trajeto do Desmoronamento (Helena Antunes, RN, 2025, ficção, curta)


Desmoronamento emocional e social atravessado por imagens indecifráveis...ou não. Incrível como muitas vezes habitar um paraíso não faz a mínima diferença. Um dos filmes mais sensoriais da mostra, gostaria de revê-lo.



Trajeto do Desmoronamento
Trajeto do Desmoronamento


Dia 23/11 – domingo/Mostra Panorama


Quem se Move (Stephanie Ricci, SP, 2025, ficção curta)


O olhar de quem sempre vai se sentir estranho e desconfortável numa terra que não é a sua. As dores de amor que se emaranham com a falta de dinheiro e perspectiva de uma juventude que não tem ideia de onde (e como) ir. Aqui, quem se move é só a câmera.


Quem se Move
Andanças noturnas


Kaira e o Temporal (Wagner Nogueira Mendes, CE, 2025, ficção, curta)


Produção de arte impressionante com figurinos, cenário e objetos de cena que transbordam inventividade, enchendo nosso olhos. Atriz mirim admirável que nos conduz numa estória futurista de resgate de memória. Alguns momentos de puro deleite com a introdução de animação. Para mim soou um tanto confusa a narrativa mas, adoraria ver novamente já que pode ter sido uma dificuldade minha.


Quem se Move
Versão animada da Kaira


Futuro Futuro (Davi Pretto, RJ, 2025, ficção, longa)


Ganhador do Festival de Brasília deste ano, Futuro Futuro é daqueles filmes cuja construção narrativa acerta em não dar grandes explicações, criando um tecido de imagens enigmático e sombrio, aqui, representado pela cor vermelha. Para quem se preocupa com o uso das IA’s e acredita nas mudanças climáticas, o futuro é cada vez mais incerto, e no pior sentido. Entre memórias apagadas e seres humanos trabalhando para as IA’s, testemunhamos gentrificação em nível hard e uma vida praticamente simulada, que lembra um jogo muito popular nos anos 2000, The Sims. Uma distopia sulista mais universal do que poderíamos supor. Mais um que preciso rever.



Mostra Competitiva


A Nave que Nunca Pousa (Ellen Morais, PB, 2025, documentário, curta)


Já a algum tempo o audiovisual se debruça em nos mostrar que a tão propalada energia limpa não é tão limpa assim, ao menos não no formato presente, onde os interesses privados mais uma vez se sobrepõe aos das comunidades rurais. Ao introduzir elementos sutis de ficção científica, a obra apresenta uma obra instigante e contundente, invertendo o ângulo de visão a qual estamos acostumados em documentários convencionais. O uso da tensão que beira o terror leva a discussão para outro patamar. Vidas ameaçadas e rotinas ensurdecedoras, a nave nunca pousa numa espera angustiante e sem fim.


A Nave que Nunca Pousa
Jantar com eólica

Ressonância (Anna Zêpa, RN, 2025, ficção, curta)


Uma mulher na meia idade, mãe-avó se vê prestes a perder a sua profissão, tão singular quanto motivo de orgulho, ao menos para ela e sua neta. Através de ondas de rádio potentes, uma máquina adentra nosso corpo em busca de doenças, oferecendo argumentos para manifestações misóginas e machistas. O problema nunca foi o que a máquina revela, mas ter alteridade. Ressonância ressoa no desejo e na teimosia, abrindo espaço pra dignidade.


Ressonância
Margarida e a neta

Aqui não entra Luz (Karol Maia, MG, 2025, documentário, longa)


Relatos de mal tratos, abusos e até sequestro cozem uma colcha de retalhos memorialística de cinco trabalhadoras domésticas, entre elas a diretora, filha de uma delas. E é nessa narrativa afetuosa e com doses de acerto de contas consigo mesma que temos um filme diferencial de tantos outros da mesma temática. Uma sociedade que não se olha no espelho e finge que trabalho análogo à escravidão pura invenção. Trabalho delicado e forte de Karol que aproveita para mergulhar nas memórias de sua mãe e encontrar o seu lugar por lá. Com direito à corte lacaniano ao final.


Aqui não entra Luz (Karol Maia, MG, 2025, documentário, longa)
Aqui não entra Luz



Dia 24/11 – segunda-feira/Sessão Especial/premiações



Dona Onete – Meu Coração Neste Pedacinho Aqui (Mini Kerti, 2025, RJ, documentário, longa)


O que dizer sobre essa maravilhosa? Filme de justa homenagem, simples, até convencional, mas musical (no sentido sensorial), afetuoso, de ponta a ponta o sorriso não descola do rosto. As deliciosas participações de Jaloo, Gaby Amarantos, Emicida e Dira Paes. As conversas sobre os bastidores das apresentações, o arrebatamento nos países por onde andou, as desconfianças dos empresários dos shows (quem é essa ?). Sabores picantes da nossa região Norte.



Rainha
Rainha

Premiações


Prêmios DOT e MISTISKA de pós-produção (empresa que investem na finalização dos filmes brasileiros):


DOT : Curta-metragem: Ressonância (Anna Zêpa, RN)

Longa-metragem: Aqui não entra luz (Karl Maia, MG)


MISTIKA : Curta-metragem: A Nave que Nunca Pousa (Ellen Morais, PB)

Longa-metragem: Morte e Vida Madalena (Guto Parente, CE)


Melhor curta-metragem Juri da Imprensa


Laudelina e a Felicidade Guerreira (Milena Manfredini, , RJ)


Melhor longa-metragem Juri da Imprensa


A Natureza das Coisas Invisíveis (Rafaela Camelo, DF)


Melhor curta-metragem Juri Popular


Pupá (Osani, RN)


Melhor longa-metragem Juri Popular


Aqui não Entra Luz (Karol Maia, MG)









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